O sábado em Êxodo 31:16-17 não era apenas para os judeus?

Pergunta do leitor RS. Tenho uma dúvida. No livro do Êxodo 31:16-17 está escrito: ''Guardarão, pois, o sábado os filhos de Israel, celebrando-o nas suas gerações como pacto perpétuo. Entre mim e os filhos de Israel será ele um sinal para sempre; porque, em seis dias, fez o Senhor o céu e a terra, e, ao sétimo dia, descansou e achou refrigério.'' Com base na explicação abordada no vídeo, a guarda e observância do sábado, não seria um mandamento somente para o povo judeu?

O mandamento sabático, descrito no texto citado por você, de Êxodo 31, foi dado para as doze tribos de Israel por volta do século XV a XIII a.C. e não apenas para Judá. O reino de Judá, como nação, surgirá na história apenas por volta de 500 ou 600 anos depois deste episódio quando as tribos de Israel se dividem separando Judá e Benjamim ao sul em 931 a.C. Neste período, Judá inicia o seu processo de nacionalização e independência das demais tribos.

O sábado foi instituído apenas para Israel?

O sábado foi instituído no Éden (Gn 2), e não era apenas para Israel, ou posteriormente para Judá. Todos os povos que desejassem abraçar a aliança feita por Deus em favor da humanidade, os estrangeiros, (Is 56:1-8), poderiam fazer parte do povo de Deus e, consequentemente, demonstrar fidelidade a Deus harmonizando sua vida e prática aos dez mandamentos, inclusive o sábado que é o quarto mandamento (Êx 20).

Um detalhe, a aliança era fundamentada na justificação forense (cordeiro), e na obediência a Deus (dez mandamentos). A salvação era unicamente pela graça. Os mandamentos de Deus nunca tiveram a função salvífica, serviam e servem apenas para mostrar onde estamos falhando no tocante a seguir a vontade de Deus.

No Novo Testamento, percebemos a manutenção do quarto mandamento, o sábado. Observe:

·         Jesus levou em consideração a guarda do sábado (Lc 4:16, 31; 6:6; 13:10; 23:56).
·         Em Mateus capítulo 12, Jesus se opõe a forma errônea de se guardar o sábado. Os judeus tornavam o templo e o mandamento do sábado maiores do que o próprio Deus, é por este motivo que Jesus afirmou que Ele era Senhor do sábado (v. 8). Para os judeus, nem mesmo a prática do bem parecia ser praticada no dia de Sábado. Jesus os contrapõe afirmando no verso 12: "É lícito fazer o bem no sábado". Bom, se era LÍCITO fazer o bem no sábado, significa que, nas palavras de Jesus, haviam coisas ILÍCITAS que não poderiam ser feitas no dia de sábado. Portanto, Jesus estava apenas corrigindo-os na maneira de encarar e guardar o quarto mandamento.

·         Em Marcos, a cena recebe algumas notas adicionais. No mesmo episódio, Marcos narra, nas palavras de Jesus, que "o Sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado" (Mc 2:27). Alguns utilizam esta declaração para reforçar a ideia da abolição do sábado. No entanto, mais uma vez, corrigindo a forma equivocada dos fariseus a respeito da guarda do sábado, Jesus reforça o mandamento. Veja como o texto fica mais compreensível com esta analogia:

·        "A igreja foi estabelecida por causa do homem, e não o homem por causa da igreja". Por este motivo a igreja seria ruim ou teria sido abolida?
·        "A santa ceia foi estabelecida por causa do homem, e não o homem por causa da santa ceia". Por este motivo, a santa ceia seria ruim ou teria sido abolida?
·        "A salvação foi estabelecida por causa do homem, e não o homem por causa da salvação". Por este motivo, a salvação seria ruim ou teria sido abolida?
·       "A mulher foi estabelecida por causa do homem, e não o homem por causa da mulher". Por este motivo, a mulher seria ruim ou teria sido abolida?

Portanto, fica claro que Jesus nunca se posicionou contrariamente ao mandamento sabático, apenas intentou corrigi-los na forma como entendiam ou observavam. Mas, os judeus distorciam de tal maneira a guarda do mandamento, que viam nas ações de Jesus uma violação do mesmo (Jo 5:16-18). Observe que eram os fariseus quem afirmavam que Jesus violava o sábado.

Outras inferências ou referências a respeito da permanência do sábado 

·        *  Maria, mãe de Jesus na carne, após conviver com Cristo por toda a sua vida, também guardou o sábado mesmo após a morte de Cristo (Lc 23:54-56).

·         * O apóstolo Paulo trabalhava durante a semana fabricando tendas (At 18:3-4), mas, à exemplo de Jesus tinha o mesmo costume de separar o sábado para estar na sinagoga (igreja), e também para ensinar o povo (At 17:2). E ele não ensinava apenas Judeus, mas também gentios e sempre no mesmo dia (At 18:4; 5-6, 11).

·         * Mais tarde, a carta aos Hebreus, que particularmente creio ser de Paulo, usará como analogia para o descanso da fé, o descanso do sábado. Ou seja, o princípio sabático parece ser a clara referência para o escritor do Novo Testamento (Hb 4).

·        * Agora, no último livro da Bíblia, embora não tenha sido o último a ser escrito, João, na ilha de Pátmos, recebe visões apocalípticas. Este dia, segundo o próprio João, era o dia do Senhor (Ap 1:10). A pergunta é a seguinte, qual era esse dia da semana? Domingo ou sábado? (Ap 1:10; Mc 2:28; Mt 12:8; Lc 23:54, 56; At 17:2; Lc 4:16, 31:6:6; 13:10; At 18:4, 11).

Embora muitos evangélicos afirmem que Deus mudou, a Bíblia afirma que:

* Deus não altera o que saiu dos seus lábios (Sl 89:34)
* Deus não muda (Ml 3:6)
* Em Deus não há mudança e sombra de variação (Tiago 1:17)
* Não devemos tirar e nem acrescentar nada da Sua Palavra (Ec 3:14; Dt 4:2; 12:32)
* Tudo o que Deus estabelece é para sempre (Ec 3:14)
* Deus não é mentiroso quanto ao cumprimento de suas palavras (Nm 23:19)
* Sua Palavra durará eternamente, para sempre (Is 40:8)
* Ele afirmou que os Seus mandamentos, preceito, são eternos (Sl 111:7-8, 119:152)
* Que não devemos ir além do que está escrito (I Co 4:6).

Mas, e quanto ao sábado mencionado em Oséias 2:11 e Colossenses 2:16? Resposta: É uma referência aos sábados cerimoniais e NÃO MORAIS. Observe que ele é acompanhado das expressões dias de festas ou luas, que eram festividades anuais, mensais e sacrifícios duplos semanais. O sábado dos dez mandamentos era moral e não semanal, mas as festividades do santuário, ocorriam especialmente uma vez ao ano, e eram chamados de sábados devido a sua solenidade. Eram 7 festas anuais que faziam parte dos ritos do santuário terrestre. Cada festa, por ter data fixa, ocorria uma vez ao ano e caia em qualquer dia da semana. Mesmo assim eram chamados de sábados. (Veja Levítico 23:4-44). Por isto que Moisés, para que o povo não confundisse esses sábados festivos com o sábado semanal do quarto mandamento, foi enfático ao afirmar:

"Além dos sábados DO SENHOR" (Lv 23:38).

Estes sábados festivos encerraram quando o santuário terrestre perdeu o seu significado e propósito. Isto ocorreu quando o verdadeiro cordeiro de Deus foi imolado (Jo 1:29) na cruz do calvário (Mt 27:51-52). Foi por este motivo, a morte de Cristo encerrando as atividades do santuário terrestre, que Paulo vai confirmar o cumprimento da profecia de Oséias 2:11 em Colossenses 2:16 como o fim dos sábados festivos anuais (Nm 28:17, mensais (Nm 28:11-15), e sacrifícios duplos semanais (Nm 28:9).

O que foi extinto, por ter prazo de validade, eram os ritos cerimoniais do santuário terrestre chamados de leis ou costumes de Moisés (At 6:14) e não os dez mandamentos (Mt 5:17; Lc 16:17).

Espero ter ajudado.

Gilberto Theiss - Graduado em Teologia, Mestrando em Interpretação Bíblica, Pós-Graduado em Filosofia e Ciências da Religião, Pós-Graduando em História e Antropologia. É pastor por paixão, escritor e autor de vários livros em área teológica, comentário homilético, comentário aplicado, profético, história da igreja (versão para jovens), música na Bíblia, apologética, relativismo e cultura.

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