Devemos orar apenas de joelhos?

Há alguns anos, presenciei uma situação muito triste em uma determinada congregação. Na época eu era Ancião de uma igreja na cidade de Natal-RN, e fui convidado a participar de uma reunião com um grupo de irmãos que estavam planejando se separarem da Igreja Adventista por não crerem mais em algumas de nossas doutrinas.

Após horas de diálogo e argumentação bíblica, os irmãos dissidentes permaneceram irredutíveis em seus pensamentos e, ao final daquela reunião fatídica, decidiram solicitar o desligamento da Instituição.


Foi um momento muito triste para os líderes locais que ali estavam, pois conhecíamos aqueles diletos irmãos e sabíamos que eles estavam equivocados, sendo influenciados por um líder com pensamentos reformistas, que na verdade só queria mais poder e autoridade eclesiástica.

Graças ao bom Deus, muitos daqueles irmãos que solicitaram o desligamento voltaram atrás (inclusive um de seus líderes, que posteriormente foi estudar no IAENE e hoje é um dos pastores mais queridos e dedicados da União Nordeste), e retornaram ao seio da Igreja Adventista, após verem a hipocrisia daquele pseudo-reformador. Pena que ainda hoje isso esteja se repetindo em diversos lugares!

Um dos temas para os quais os dissidentes haviam adquirido "nova luz" (como eles gostavam de dizer) era a posição para a oração. Na visão deles, a única posição válida para se orar é SOBRE OS JOELHOS, ou seja, uma oração feita em pé (principalmente se for no culto) é uma desonra a Deus e ao Espírito Santo.

Eu lembro que há algum tempo (quando eu ainda estava no Seminário), esta questão também provocou grande cisma em algumas congregações em Feira de Santana/BA e região. E como eu recebi alguns e-mail nos últimos dias sobre esta questão, resolvi disponibilizar aqui um estudo sobre o assunto.

Como eu disse na minha última postagem, é IMPRESSIONANTE como as mesmas questões vivem ressurgindo na mente dos que têm espírito crítico, exatamente porque tais pessoas se negam a buscar uma resposta confiável e verdadeira sobre estes assuntos, e preferem apenas se deixarem influenciar pelos conteúdos apresentados em sites dissidentes ou por líderes carismáticos inescrupulosos.

O material abaixo é uma adaptação de um estudo preparado pelo querido Pastor e Professor Demóstenes Neves, do IAENE. 

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Algumas pessoas, no desejo de obedecer estritamente o que Deus ordena, têm tomado textos sobre a oração de joelhos, na Bíblia e no Espírito de Profecia, e tentado “provar” que somente de joelhos a oração é aceitável a Deus.

Vamos, aqui, fazer uma abordagem visando dar uma visão geral do assunto, a fim de que a compreensão correta possa ser conseguida por todos, e os pontos de vista pessoais e unilaterais sejam abandonados.

I - O QUE A BÍBLIA DIZ

A Bíblia é quem estabeleceu a nossa doutrina, por isso precisamos saber sua posição sobre o assunto, em primeiro lugar. Ela nos ensina a orar em várias posições:

1. De joelhos - conforme o exemplo de vários personagens bíblicos:
Dn 6:10; 1Co 14:25; Esd. 9:5; Lc 22:41; At 7:60; etc.

2. Em pé - conforme outros exemplos, que na maioria das vezes são esquecidos pelos fanáticos:

a) Simeão orou em pé (cf. Lc 2:27-35).
b) Jesus, ao ressuscitar Lázaro, orou em pé (cf. Jo 11:41-42).
c) Ana orou em pé (cf. 1Sm 1:9,10).
d) O fariseu e o publicano justificado oraram em pé, e Deus não olhou a posição física, mas o estado do coração (cf. Lucas 18:11-14). Aliás, ao Jesus contar esta História, Ele mostrou que era normal, na Sua época, os homens orarem no templo em pé.
e) Salomão fez a bênção inicial no templo em pé (cf. 1Rs 8:14; 2Crôn. 6:3).
f) Salomão fez a bênção final no templo em pé (cf. 1Rs 8:55-61).
g) Durante a oração, Salomão estava de joelhos (cf. 2Cr 6:13) mas, o povo ficou em pé e só ajoelhou quando caiu o fogo do céu, como sinal de que Deus ouviu a oração (cf. 2Cr 7:1-3). Os sacerdotes e os cantores estavam em pé (cf. 2Cr 7:6).
h) Neemias, que orou a Deus diante do Rei Artaxerxes, estava em pé (cf. Ne 2:4).

Estas orações foram feitas em pé e Deus as ouviu, mesmo quando feitas no templo.

II. O QUE ELLEN G. WHITE DIZ

(Como regra geral)

"Para orar não é necessário que estejais sempre prostrados de joelhos. Cultivai o hábito de falar com o Salvador quando sós, quando estais caminhando, e quando ocupados com os trabalhos diários" - A Ciência do Bom Viver, pág. 510-511.

Portanto:

a) Nem sempre é preciso estar de joelhos para orar
Devemos orar constantemente, com espírito humilde e manso. Não precisamos esperar por uma oportunidade para ajoelhar-nos diante de Deus. Podemos orar e conversar com o Senhor onde quer que estivermos” – Mens. Escolhidas, vol. 3, p. 266.

b) Pode-se orar a sós, sem ajoelhar
Orai em vosso aposento particular; e enquanto seguis vossos afazeres diários, elevai muitas vezes o coração a Deus” - Caminho a Cristo, 99; ver também: CBV, 511.

c) Pode-se orar caminhando pelas ruas em meio ao barulho do povo, ou trabalhando em meio às máquinas
Podemos falar com Jesus ao caminhar, e Ele diz: Acho-Me à tua mão direita (Sal. 16:8). Podemos ter comunhão com Deus em nosso coração; andar na companhia de Cristo. Quando empenhados em nossos trabalhos diários, podemos exalar o desejo de nosso coração, de maneira inaudível aos ouvidos humanos” - Obreiros Evang., 258.

III. O QUE ELLEN G. WHITE FAZIA

a) Orava na igreja de joelhos.
Fiquei surpresa ao ver toda a congregação levantar-se. Solicitei, então, que todos se ajoelhassem, e enviei minha petição ao Céu por esse povo. Fiquei profundamente impressionada com esta experiência” – Mens. Escolhidas, vol. 3, 267.

b) Orava com a igreja sentada.
Dissemos-lhes que o melhor que podiam fazer era sentar-se mesmo onde estavam, e todos buscaríamos juntos o Senhor confessando nossos pecados” – Mens. Escolhidas, vol. 3, 267.

c) Orava com a igreja em pé.
Convidei todos quantos quisessem entregar-se a Deus em concerto sagrado, e servi-Lo de todo o coração, a que se levantassem. A casa estava cheia, e quase todos se ergueram. Estavam presentes pessoas não pertencentes a nossa fé, e algumas se levantaram. Apresentei-as ao Senhor em fervorosa oração, e sabemos que tivemos a manifestação do Espírito de Deus. Sentimos que havia sido realmente obtida uma vitória” – Mens. Escolhidas, vol. 3, 268.

Pergunto: quem agora fará decidido esforço para obter a educação superior? Os que quiserem, manifestem-no pondo-se em pé. [A congregação se levantou.] Eis aqui toda a congregação. Deus vos ajude a cumprir o vosso compromisso. Oremos” – Idem, 269.


IV. UM CASO ESPECIAL

Alguns perguntam:
“Por que, então, Ellen White repreendeu alguém que estava iniciando a oração em pé?”

O texto é o seguinte:

"Tenho recebido cartas perguntando-me sobre a posição que deve ser assumida pela pessoa ao fazer oração ao Soberano do Universo. Onde obtiveram nossos irmãos a idéia de que deviam ficar em pé quando oram a Deus? [...] Prostre-se de joelhos! Esta é sempre a posição apropriada" – Mens. Escolhidas, vol. 2, p. 311.

Considerações:

a) Nem sempre esta é a posição apropriada para a oração, como já vimos pela Bíblia e pelas declarações e exemplos acima.

b) O contexto da citação acima demonstra que Ellen White estava repreendendo alguém que fora educado em Battle Creek (centro da denominação na época), e de lá estava vindo um espírito de desafio à Obra e falta de reverência. Pois por lá haviam influências, como as do Dr. John Harvey Kellogg, que diziam que Deus era uma energia que permeava a natureza (uma espécie de “panteísmo”). Note como Ellen White relaciona a postura da pessoa que orou com Battle Creek com a dos professores do Colégio:
Em Battle Creek. Será possível que com todo o esclarecimento que Deus tem dado a Seu povo sobre a reverência, pastores, diretores e professores de nossas escolas, por preceito e exemplo ensinem os jovens a ficarem em pé na devoção, como faziam os fariseus? Consideraremos isto demonstrativo de sua presunção e importância própria? Devem essas características tornar-se distintas?” – Mens. Escolhidas, vol. 2, p. 313.
Em quem podemos confiar como professores de nossas escolas nos Estados Unidos e nos outros países? Deverão os alunos voltar às suas pátrias depois de anos de estudos, com idéias pervertidas acerca do respeito, da honra e da reverência que deviam ser dados a Deus, e sem se sentirem sob o dever de honrarem os homens de cabelos brancos, os homens de experiência, os escolhidos servos de Deus que têm estado relacionados com a obra de Deus durante quase todos os anos de sua vida? Aconselho a todos os que freqüentam escolas na América do Norte ou em qualquer outro lugar a que não absorvam o espírito de irreverência” – Idem, 314.

Na realidade, aquela pessoa que orou em pé (e foi repreendida por Ellen White) era apenas um representante de uma filosofia que estava existindo na época, em Battle Creek. Por isso a denúncia vigorosa, e conseqüente repreensão pública.
c) O que realmente importa é a humildade interior, pois o exemplo que a irmã White usa nesse mesmo trecho do seu escrito, é o de Lucas 18:9-12. Nele, o fariseu estava em pé com o coração exaltado. Ela nos aconselha a nos prostrar como o publicano que apesar de ficar em pé “fisicamente” estava prostrado “interiormente”, e desceu para casa justificado (cf. Mens. Escolhidas, vol. 2, 313-314; Paráb. de Jesus, 151).

d) O objetivo da advertência era combater a imponência e o espírito irreverente que estava sendo cultivado por pessoas de Battle Creek, e não era intenção dar uma regra geral dogmática sobre o tema, para a Igreja.

e) Por outro lado, Ellen White mesma por várias vezes declarou que podemos orar andando, trabalhando, ou mesmo quando a sós, sem ajoelhar, como vimos em textos acima. Ela mesma orou muitas vezes com toda congregação em pé ou assentada.

CONCLUSÃO:

A Igreja Adventista do Sétimo Dia faz a oração principal de joelhos, sempre que possível. Mas durante o culto, também se admite oração em pé e sentados, em harmonia com a Bíblia e o Espírito de Profecia.

Se a oração é “a respiração da alma” (Mensagens aos Jovens, p. 249), não devemos limitá-la apenas para quando estivermos de joelhos, mesmo quando no templo. Isso seria farisaísmo legalista.

Oremos sem cessar, seja andando, sentados, em pé ou de joelhos, onde quer que estivermos (cf. 1Tess. 5:17).

Fonte: Blog Gilson Medeiros