Herdeira da Reforma Protestante, Igreja Luterana na Alemanha ordena mulheres e abre caminho para casamento gay

Há exatamente 500 anos Martinho Lutero provocava o terremoto que abalou as estruturas da Igreja Católica e provocou a cisão do cristianismo. Cinco séculos depois, a herdeira direta da Reforma Protestante mostra que mantém vivo o espírito de mudança que inspirou o jovem monge. O fim do celibato, o perdão pela fé e a popularização da Bíblia fazem parte da doutrina luterana desde o rompimento com o Vaticano. Nas últimas décadas, porém, a Igreja Luterana da Alemanha (EKD) se abriu a temas atuais e aceitou reinvindicações que ainda são tabus em algumas esferas da sociedade.
A primeira grande mudança ocorreu no fim da década de 1940, com a abertura para a ordenação de mulheres.

Em 2015, as mulheres eram 33% dos ordenados. Embora aceitasse pastoras, o caminho foi longo até a nomeação da primeira bispa, que ocorreu somente em 1992. Atualmente, a igreja promove uma campanha de equiparação de gênero em todos os níveis da instituição.

"A ordenação de mulheres é uma consequência da teologia do batismo de Lutero. Para ele, todo cristão batizado pode ser padre, bispo e até papa, então essa premissa é válida também para as mulheres", afirma Margot Käßmann, que assumiu o mais alto posto da EKD entre 2009 e 2010 e atualmente é a embaixadora da reforma.

Além buscar a equiparação, em 2013, a EKD deu um passo importante para combater o preconceito contra homossexuais. Nesse ano, a instituição publicou novas diretrizes para o modelo familiar e passou a considerar uma família qualquer núcleo onde haja amor, deixando de lado o tradicional "pai e mãe casados com filhos" e aceitando parceiros do mesmo sexo.

Ao justificar a mudança, a EKD lembrou que padrões tradicionais eram contestados há anos e essa luta havia alcançado mudanças sociais e legais que reconheceram a diversidade familiar e a igualdade de direitos entre os membros de diferentes constelações familiares.

Diante desse reconhecimento, a igreja afirmou que também precisa se atualizar. A alteração das diretrizes ocorreu mesmo com a oposição das alas mais conservadoras dentro da EDK.
Já no caso do casamento entre homossexuais, a aceitação religiosa veio bem antes da legal. Desde 2013, regionais da EKD começaram a aprovar e realizar o matrimônio homoafetivo. O Parlamento alemão, porém, só legalizou o casamento gay em junho deste ano.

A primeira a oferecer a cerimônia de casamento para casais do mesmo sexo foi a regional de Hessen-Nassau, que compreende a região de Frankfurt. A iniciativa foi até agora seguida por outras quatro das 20 regionais no país. Em algumas das que ainda não aprovaram a mudança, é oferecida, no entanto, uma benção para casais homossexuais.

A mudança nas diretrizes sobre a constituição familiar possibilitou ainda que a igreja pudesse aceitar também abertamente pastores homossexuais e seus parceiros.
Käßmann afirmou que a discussão sobre a homossexualidade ocupou a igreja durante anos e, no fim, após a análise da Epístola aos Romanos - considerado por Lutero o evangelho mais importante do Novo Testamento -, chegou-se à conclusão que casais do mesmo sexo, que possuem relações baseadas na confiança, fidelidade e responsabilidade, não devem ser excluídos da bênção de Deus.


"A igreja da Reforma precisa se transformar continuamente. Ela não é uma instituição imóvel, mas feita por pessoas e por isso pode aprender", ressaltou Käßmann.

(Folha de São Paulo)

Nota Gilberto Theiss: A matéria ressalta que a primeira grande mudança no luteranismo foi exatamente a ordenação de mulheres. De lá para cá outras mudanças foram tracionadas. Estudos feitos nos EUA por teólogos contrários a ordenação de mulheres detectaram que as principais igrejas norte americanas que aprovaram a ordenação de mulheres, anos depois se abriram para o casamento gay e a ordenação de bispos e pastores homossexuais. A igreja Luterana foi um exemplo desta notória façanha. Qual a relação para essa aproximação estabelecida entre a ordenação de mulheres com a aceitação do casamento gay? 

Alguns teólogos apontam para a quebra do preconceito cultural. Através de estudos teológicos isentos de conceitos culturais, ou seja, levando em consideração apenas o clamor da reforma do TOTA E SOLA SCRIPTURA, não é possível defender a ordenação feminina usando apenas a Bíblia. Todavia, a história pode ser outra se os estudos levarem em consideração os aspectos culturais de cada época. Mas há dois problemas visivelmente percebido nesta segunda premissa. 

Primeiro: A centralidade do TOTA E SOLA SCRIPTURA é rompida condicionando a Bíblia aos ditames da cultura. 

Segundo: Condicionando a Bíblia aos ditames da cultura, o mesmo se condicionará aos estudos que levam em consideração a homossexualidade e demais grupos correlatos. 

Foi exatamente este fenômeno teológico que ocorreu com as principais igrejas que passaram a ordenar mulheres ao ministério nos EUA e Europa. O mesmo princípio se torna a base de todo e qualquer estudo teológico. A Bíblia passa a ser relativista à cultura. A teologia dessas igrejas americanas por exemplo se condicionou ao culturalismo, levando-as ao mero acaso relativista à cultura. A teologia cristã se torna volúvel se transformando em teologia bíblica cultural. O curioso é que os apelos feministas feito, inclusive por homens, não vieram de estudos teológicos exegéticos cristãos, mas sob as bases do clamor feminista que tem adquirido muito poder nos últimos anos ao redor do mundo. De lá para cá, muitos estudos teológicos têm sido feitos levando em consideração este apelo. Mesmo a igreja católica tem sofrido com as pressões para a ordenação feminina. 

O movimento feminista cristão alega que as igrejas que não aceitam estão ainda maculadas com o machismo. Na verdade, este grito é oriundo do feminismo global que encara, inclusive, o próprio matrimônio como um patrimônio criado pelo machismo. Portanto, a exemplo da ordenação feminina, se este clamor ganhar espaço, em breve veremos nas próprias igrejas cristãs as pressões para, do ponto de vista cultural, o decreto do fim do próprio casamento. Já há teólogos fazendo exegese levando a consideração a relevância que o cristianismo precisa ter para com o homossexuais e o novo sistema familiar. Enfim, aos poucos a cultura vai tornando obsoleta a hermenêutica bíblica centrada no autor/texto transferindo o poder da interpretação aos moldes do leitor. Assim, cada grupo, comunidade ou pessoa adquire o poder de relativizar a Bíblia segundo a sua conveniência cultural.

Assista este comentário do Pr. Doug Batchelor sobre o passo seguinte construído após a ordenação femininas nas principais igrejas americanas.