Poucos anos atrás, os
principais jornais brasileiros anunciaram que o ser humano havia “criado” vida
em laboratório. O Globo foi o mais enfático: “Criada vida artificial.” A Folha
de S. Paulo também deu a manchete: “Ciência cria primeira célula sintética.” O
artigo original foi publicado na revista Science, e a história não é bem assim.
O que os cientistas
financiados pela empresa americana Synthetic Genomics fizeram foi copiar o DNA
de uma bactéria e depois introduzi-lo em uma bactéria de outra espécie. Esta
passou a se reproduzir, replicando as características impressas pelos
pesquisadores. Foi, sem dúvida, uma grande façanha científica, mas não uma
“revolução”, como alguns jornais apontaram.
Conforme ironizou
Luciano Martins Costa, em artigo publicado no site Observatório da Imprensa,
“talvez seja mesmo mais fácil criar vida sintética nas páginas do jornal do que
encontrar vida inteligente no mundo real”.
William Dembski, no
site Uncommon Descent, também comentou: “A retórica é interessante. O que eles
fizeram foi enfiar um genoma sintético dentro de uma célula não sintética. No
entanto, eles falharam ao falar de ‘síntese de célula bacteriana’. De fato, uma
manchete diz: ‘A primeira célula sintética autorreplicante’. Isso é enganador.
Se alguma coisa vai ser chamada de ‘sintética’, não devia a totalidade dessa
coisa ser sintetizada, e não apenas uma parcela minúscula da mesma? E não
sabemos que essa célula evidencia design e, em caso afirmativo, por que não
haveriam as células que não foram tocadas pela Synthetic Genomics fazer o
mesmo, ou seja, implicar design?”
Menos entusiasmo
A revista Veja da
semana seguinte ajudou a diminuir o entusiasmo dos jornalistas sensacionalistas
que anunciaram a criação de “vida sintética” em laboratório. Na matéria “Eles
ainda não são deuses”, a semanal explicou: “O extraordinário anúncio de Craig
Venter exige uma explicação que, para ser bem clara, deve começar pelo que a
pesquisa com o genoma do Mycoplasma mycoides não é:
“Ela não é a criação
artificial da vida, nem a criação de vida artificial. Isso significa que Venter
não partiu de matéria inanimada e com ela produziu um ser vivo. Tampouco
produziu um ser com base em alguma química vital misteriosa desconhecida da
ciência.
“Não é a criação de
célula ou bactéria sintéticas. A equipe americana conseguiu, sim, desenhar,
sintetizar e montar o genoma de uma bactéria e inserir esse material em uma
bactéria diferente. O genoma é o conjunto completo do material hereditário que
a maioria dos seres vivos carrega e utiliza para produzir descendentes da mesma
espécie. Portanto, não houve a criação sintética de um organismo vivo completo,
mas apenas de seu núcleo genético.
“Não é a invenção de
um novo genoma. Venter e equipe recriaram um genoma que já existe na natureza.
A metáfora mais clara e obrigatória é com alguém que desmonta um relógio,
depois remonta as peças, instala o conjunto em um estojo diferente e o
mecanismo volta a funcionar normalmente. Ainda assim, para fazer o mecanismo
genético sintético funcionar na nova célula a equipe americana precisou
enxertar sua criação com DNA natural da célula receptora.
“Não é o maior avanço
genético de todos os tempos. O título fica ainda com Crick e Watson, pais da
biologia molecular. Craig Venter levaria o título se tivesse criado o primeiro ser
vivo artificial, sem um antepassado, portanto, a partir de matéria inanimada.
Isso ainda é privilégio da natureza. Continua de pé o repto lançado por Charles
Darwin, pai da teoria da evolução, morto em 1882, segundo o qual todo o seu
trabalho poderia ser jogado na lata de lixo se lhe apontassem um ‘único ser
vivo que não tivesse um antepassado’.”
O fato é que os
cientistas não criaram nada, mas provaram que mesmo a cópia da vida tem que ser
projetada.
[Créditos da imagem: Fotolia]
Michelson Borges é
jornalista, editor na Casa Publicadora Brasileira e mantenedor do blog
www.criacionismo.com.br